Busca

Preconceito linguístico

Preconceito linguístico é um tipo de preconceito que tem como alvo pessoas que usam variedade linguística distinta da norma-padrão. Está associado ao preconceito de classe.

Por Warley Souza

Ícones de três pessoas conversando enquanto outra está isolada, uma representação do preconceito linguístico.
O preconceito linguístico é direcionado a pessoas que utilizam uma variedade linguística distinta da variedade padrão.
Crédito da Imagem: Shutterstock.com
Imprimir
Texto:
A+
A-

PUBLICIDADE

Preconceito linguístico é o preconceito direcionado a pessoas que utilizam variedade linguística divergente da norma culta ou padrão. Os agentes desse tipo de preconceito consideram a norma-padrão (utilizada por uma classe social privilegiada) superior a outras variedades menos prestigiadas.

Pessoas com baixa ou precária escolaridade (pertencentes, em maioria, à classe baixa) são alvo do preconceito linguístico. Desse modo, o preconceito linguístico é apenas uma faceta do preconceito de classe. Também sofrem preconceito linguístico grupos sociais marginalizados, que utilizam gírias, e pessoas provenientes do Nordeste brasileiro, identificadas por sotaque e uso de regionalismos.

Leia também: Quais são os elementos essenciais da comunicação?

Resumo sobre preconceito linguístico

  • O preconceito linguístico é o desprezo por variedades linguísticas distintas da norma culta.
  • O preconceito linguístico sempre acompanha outros tipos de preconceito, como o de classe, por exemplo.
  • Sofrem preconceito linguístico pessoas que não utilizam a norma culta da língua portuguesa.
  • Desinformação e elementos ideológicos são fatores causadores do preconceito linguístico.

Videoaula sobre preconceito linguístico

O que é preconceito linguístico?

O que caracteriza o preconceito é o julgamento sem fundamento contra pessoas que utilizam variedade linguística divergente da norma culta ou padrão, o que pode gerar sentimento hostil ou intolerância direcionada à pessoa alvo desse preconceito. Assim, o preconceito linguístico é mais um dos inúmeros preconceitos existentes em uma sociedade. Nesse caso, é o preconceito direcionado a pessoas que “falam errado”, ou melhor, que não dominam as regras da gramática normativa ou, ainda, que utilizam uma variedade linguística distinta da variedade padrão.

Não pare agora... Tem mais depois da publicidade ;)

Exemplos de preconceito linguístico

Julgar pessoas por utilizarem variedade linguística distinta da norma-padrão se configura em preconceito linguístico, assim como desrespeitar a variedade linguística de alguém e tratar tal pessoa de forma diferente ou discriminativa em função de sua forma de falar. Ele também pode ocorrer em ambiente de trabalho e prejudicar o desempenho e a qualidade de vida da vítima.

Veja também: 5 dúvidas linguísticas que são muito comuns

Quais são as causas do preconceito linguístico?

Há, basicamente, duas causas para qualquer tipo de preconceito. A primeira delas é a ignorância, o desconhecimento acerca de determinado assunto, o que leva a julgamentos infundados. A segunda é a ideologia política, o combate intencional a determinados grupos sociais motivado por interesses pessoais.

Afinal, como diz o linguista Marcos Bagno, a sociedade em que estamos inseridos é “uma sociedade que, para existir, precisa da discriminação de tudo o que é diferente, da exclusão da maioria em benefício de uma pequena minoria, da existência de mecanismos de controle, dominação e marginalização”.

Perceba que Bagno trata como “minoria” os privilegiados, de forma que a “maioria” é alvo de algum tipo de preconceito ou mecanismo de controle. Segundo ele, a “Gramática Tradicional permanece viva e forte porque, ao longo da história, ela deixou de ser apenas uma tentativa de explicação filosófica para os fenômenos da linguagem humana e foi transformada em mais um dos muitos elementos de dominação de uma parcela da sociedade sobre as demais”.

Ele também afirma:

A Gramática Tradicional, funcionando como uma ideologia linguística, foi e ainda é, como toda ideologia, o lugar das certezas, uma doutrina sólida e compacta, com uma única resposta correta para todas as dúvidas. Por isso, o que não está abonado na gramática normativa é “erro” ou simplesmente “não é português”, e se alguma palavra não se encontra no dicionário é porque simplesmente ela “não existe”!

Quem sofre preconceito linguístico?

Ilustração de um homem bem-vestido diante de um homem maltrapilho representando uma pessoa que sofre preconceito linguístico.
O preconceito linguístico é resultante do preconceito de classe.

Sofrem preconceito linguístico, principalmente, pessoas com baixa ou precária escolaridade. Como a maioria dessas pessoas faz parte da classe baixa, o preconceito linguístico está associado a um preconceito de classe. Também sofrem preconceito linguístico pessoas pertencentes a alguns grupos sociais marginalizados.

Por exemplo, o uso do pajubá (gíria utilizada por algumas pessoas homossexuais e travestis) pode ser alvo de preconceito linguístico. Mais uma vez, tal preconceito está associado a outro tipo de preconceito, ou seja, de gênero ou de orientação sexual. Outras vítimas de preconceito linguístico são pessoas originárias da região Nordeste do Brasil.

“Oxente” e “vixe”, duas palavras usadas por nordestinos.
O uso de expressões regionais coloca os nordestinos no grupo de pessoas que sofrem preconceito linguístico.

Nesse caso, tais pessoas são identificadas pelo sotaque e uso de regionalismos. Portanto, fica claro que o preconceito linguístico não existe de forma isolada, mas combinado com outros tipos de preconceito. Dessa forma, o desprezo por uma determinada variedade linguística é também o desprezo pela pessoa que utiliza tal variedade.

Relação entre preconceito linguístico e variação linguística

A língua culta, aquela que obedece às regras da gramática normativa, é uma variedade linguística. No entanto, essa variedade é prestigiada, considerada por alguns como superior a outras variedades. Mas a linguística, que é uma ciência, não considera nenhuma variedade superior ou inferior, todas têm o seu valor.

Assim, o preconceito linguístico está associado ao desprezo por variedades linguísticas distintas da variedade padrão. Desse modo, alguém que utilize a língua padrão (comumente associada a pessoas de classe alta) não sofre preconceito linguístico. Tal preconceito é direcionado a falantes de variedades linguísticas de menos prestígio.

Norma culta e o preconceito linguístico

O preconceito linguístico tem como alvo pessoas que não dominam a norma culta, isto é, as regras da gramática normativa. Considerar apenas a norma culta como certa e atribuir o caráter de erro a falares que se desviam dessa norma são fatores que alimentam o preconceito linguístico.

Preconceito linguístico é crime?

No Brasil, não existe uma lei que criminalize especificamente o preconceito linguístico. No entanto, ele pode evidenciar outros tipos de preconceito punidos por lei.

O artigo primeiro da lei 7.716, de 5 de janeiro de 1989, diz: “Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Por exemplo, o preconceito contra pessoas nordestinas está associado a preconceito de “procedência nacional”.

Preconceito linguístico no Brasil

Capa do livro Preconceito linguístico, de Marcos Bagno, publicado pela editora Parábola.
Marcos Bagno, autor do livro Preconceito linguístico, da editora Parábola, é o principal estudioso do tema no Brasil.[1]

O preconceito linguístico não é um fenômeno apenas brasileiro, falantes de outras línguas também podem sofrer esse tipo de preconceito. No entanto, no Brasil, segundo o linguista Marcos Bagno, existe também preconceito contra a linguística (ciência responsável pelo estudo da linguagem humana) e contra linguistas. Assim, haveria, em nossa sociedade, uma preferência pela “doutrina gramatical tradicional”, mais valorizada do que o estudo científico da linguagem, isto é, a linguística moderna.

Por outro lado, houve uma evolução no tratamento do assunto nas últimas décadas. Atualmente, o tema “preconceito linguístico” faz parte do conteúdo das aulas de Português, além de ser cobrado na prova de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias do Enem. Essa não era uma realidade escolar antes dos anos 2000. O que queremos dizer é que o assunto está em evidência. Contudo, tal preconceito ainda é ideologicamente defendido por alguns, em vez de ser combatido por todos nós.

Como combater o preconceito linguístico?

Para o linguista Marcos Bagno, professoras e professores devem tomar algumas atitudes necessárias para combater o preconceito linguístico:

  • formação e informação;
  • criticidade durante a prática docente;
  • conscientização de pais, diretores e donos de escola acerca da evolução da ciência da linguagem;
  • ensino da língua de forma não preconceituosa.

Com isso, o famoso linguista mostra a importância de professores e professoras no combate ao preconceito linguístico. Para isso, tais profissionais devem ter uma boa formação e disseminar a informação acerca das novas perspectivas dos estudos da linguagem.

Não é novidade que a melhor forma de combater qualquer tipo de preconceito é a informação. A informação acerca das variedades linguísticas é de responsabilidade dos estudiosos da língua, mas também da mídia, que precisa respeitar o saber acumulado de linguistas e professores da área, de forma a disseminar informação e não preconceitos.

Saiba mais: O que são vícios de linguagem?

Quais as consequências do preconceito linguístico?

Podemos listar como consequências do preconceito linguístico:

  • alimentar o preconceito de classe,
  • contribuir para a discriminação de grupos sociais marginalizados,
  • ajudar a aumentar a tensão entre regiões mais prestigiadas e menos prestigiadas do país.

Além disso, faz com que algumas pessoas passem a ter receio ou vergonha de se expressarem. Portanto, o preconceito linguístico é uma forma de opressão.

Créditos da imagem

[1] Editora Parábola (reprodução)

Fontes

BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico. 49. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007.

BRASIL. Lei n. 7.716, de 5 de janeiro de 1989. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7716.htm.

Videoaulas