Luís Vaz de Camões

Por Warley Souza

Luís Vaz de Camões é considerado um dos mais importantes autores da literatura portuguesa. Ele nasceu no ano de 1524, na cidade de Lisboa. Muito do que se sabe de sua vida não passa de especulação e lenda. No entanto, estudiosos afirmam que ele foi soldado, perdeu um olho no Marrocos, e viveu alguns anos na Índia, em Macau e em Moçambique.

O autor, que morreu em 1580, escreveu Os Lusíadas, um poema épico do classicismo português. Assim, é possível observar, nas obras do escritor, as seguintes características dessa escola literária: versos regulares, amor e mulher idealizados, bucolismo, além de referências greco-latinas.

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Biografia de Luís Vaz de Camões

“Retrato de Camões” (1581), de autor desconhecido.
“Retrato de Camões” (1581), de autor desconhecido.

Luís Vaz de Camões nasceu, oficialmente, em 1524, na cidade de Lisboa, mas alguns estudiosos afirmam que pode ter sido em 1525. Fato é que a vida do escritor é cercada de especulações e lendas. Contudo, acredita-se que estudou Filosofia e Literatura na Universidade de Coimbra, onde seu tio, o frade D. Bento de Camões, era chanceler.

O escritor lutou, como soldado, em Ceuta, no território do Marrocos. Nesse período, perdeu o olho direito em batalha. De volta a Portugal, em 1552, foi preso devido a um desentendimento com certo funcionário da Corte. Um ano depois, recebeu o perdão do rei. Partiu, então, para Goa, Índia, em 1553. Alguns estudiosos afirmam que ele começou a escrever Os Lusíadas nessa época.

Em Macau, trabalhou como provedor-mor de defuntos e ausentes. Quando voltava para Goa, sofreu um naufrágio e quase perdeu os originais de sua obra-prima. O que se conta é que nadou com um braço enquanto o outro permanecia erguido e segurava o manuscrito. Nessa ocasião, sua amante chinesa Dinamene acabou morrendo. À sua memória, o poeta dedicou vários versos.

Em 1568, estava vivendo, em Moçambique, em péssimas condições financeiras. Um ou dois anos depois, decidiu voltar a Portugal, com ajuda de amigos, que pagaram suas dívidas e compraram a passagem. Desse modo, em 1572, publicou Os Lusíadas, dedicado ao rei D. Sebastião (1554-1578), que concedeu ao autor uma pensão durante três anos.

No fim da vida, o poeta estava doente e pobre. Morreu em 10 de junho de 1580, sem deixar dinheiro para pagar o próprio enterro. No mais, as obras do autor acabaram servindo aos estudiosos como fonte de informação acerca de sua biografia. Eles buscavam, assim, trazer luz à vida do lendário Camões.

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Características das obras de Luís Vaz de Camões

A poesia camoniana é caracterizada pelo uso da medida nova, isto é, versos decassílabos (10 sílabas). No entanto, alguns de seus poemas dialogam com o trovadorismo (poesia medieval), portanto, apresentam redondilhas, que são versos de cinco ou sete sílabas. Além disso, o poeta demonstra uma visão filosófica do amor, definido por meio de antíteses e paradoxos, como comprova esta estrofe de um de seus sonetos mais famosos:

Amor é um fogo que arde sem se ver,
É ferida que dói, e não se sente,
É um contentamento descontente,
É dor que desatina sem doer.

As principais temáticas da poesia camoniana são:

  • o desconcerto do mundo;

  • a inconstância; e

  • o sofrimento amoroso.

Camões vivia em uma época em que a racionalidade era extremamente valorizada, em oposição à fé religiosa, que marcara o período histórico anterior, ou seja, a Idade Média. Portanto, apontar o desconcerto (o desequilíbrio) da realidade era uma forma de tirar dela o véu das ilusões. Assim, a constatação de que tudo na vida é transitório eliminava a importância das coisas mundanas.

Ainda nesse sentido, somente o pensamento filosófico e a arte podiam atingir o equilíbrio, a harmonia perfeita. A razão e a expressão artística estavam, dessa forma, em posição de superioridade se comparadas aos afazeres diários e às regras sociais. Por isso, o amor carnal mostrava-se inferior ao amor ideal, filosófico e não sexualizado.

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Obras de Luís Vaz de Camões

Capa do livro “Os Lusíadas”, de Luís Vaz de Camões, publicado pela editora BestBolso. [1]
Capa do livro “Os Lusíadas”, de Luís Vaz de Camões, publicado pela editora BestBolso. [1]
  • Os Lusíadas (1572) — epopeia

  • Anfitriões (1587) — teatro

  • Filodemo (1587) — teatro

  • Rimas (1595) — poesia lírica

  • El rei Seleuco (1645)|1| — teatro

Os Lusíadas

Os Lusíadas é a obra-prima de Camões e único livro publicado durante a vida do autor. A obra é um poema épico, dividido em 10 cantos, com versos decassílabos (10 sílabas poéticas). Por ser uma epopeia, traz a figura heroica de Vasco da Gama (1469-1524) e enaltece a nação portuguesa:

As armas e os Barões assinalados
Que da Ocidental praia Lusitana
Por mares nunca de antes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
[...]

O poema foi dedicado ao rei D. Sebastião I:

Vós, poderoso Rei, cujo alto Império
O Sol, logo em nascendo, vê primeiro,
Vê-o também no meio do Hemisfério,
E quando desce o deixa derradeiro;
Vós, que esperamos jugo e vitupério
Do torpe Ismaelita cavaleiro,
Do Turco Oriental e do Gentio
Que inda bebe o licor do santo Rio:

Inclinei por um pouco a majestade
Que nesse tenro gesto vos contemplo,
Que já se mostra qual na inteira idade,
Quando subindo ireis ao eterno templo;
Os olhos da real benignidade
Ponde no chão: vereis um novo exemplo
De amor dos pátrios feitos valorosos,
Em versos divulgado numerosos.
[...]

O livro conta a viagem de Vasco da Gama e de sua frota portuguesa a caminho da Índia. No início da aventura, os deuses do Olimpo discutem se os lusitanos devem ter sucesso em sua empreitada. Com aprovação deles, a frota chega a Moçambique e depois parte para Melinde, onde Vasco da Gama conta ao rei desse lugar a história gloriosa de Portugal.

Depois da narrativa, a frota de Gama segue rumo a Calicute, na Índia. No entanto, Baco, Netuno e outros deuses do mar decidem, com a ajuda de Éolo, afundar os navios da expedição, pois temem que os portugueses acabem sendo tão poderosos quanto os deuses. Quase vencidos pela tempestade, Vasco da Gama roga a Deus:

Vendo Vasco da Gama que tão perto
Do fim de seu desejo se perdia,
Vendo ora o mar até o Inferno aberto,
Ora com nova fúria ao Céu subia,
Confuso de temor, da vida incerto,
Onde nenhum remédio lhe valia,
Chama aquele remédio santo e forte
Que o impossível pode, desta sorte:

— Divina Guarda, angélica, celeste,
Que os céus, o mar e terra senhoreias:

Tu, que a todo Israel refúgio deste
Por metade das águas Eritreias;
Tu, que livraste Paulo e defendeste
[...]

Após a prece, Vasco da Gama é ajudado por Vênus e chega a Calicute, onde vive mais perigosas aventuras. Em seguida, ao regressar a Portugal, os navegantes encontram a Ilha dos Amores. Ali, ninfas, atingidas pelas flechas de Cupido, apaixonam-se pelos navegantes portugueses, que têm, assim, em um lugar agradável, a recompensa pela sua coragem, antes de retomarem o caminho de volta a casa.

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Poesias de Luís Vaz de Camões

No seguinte soneto de Camões, o eu lírico fala da passagem do tempo. Diz que o destino trouxe a dor e recorda a felicidade do passado, mas o eu lírico chega a duvidar das alegrias que sentiu, já que elas passaram tão rápido. Por fim, ele conclui que já não tem nada a perder, a não ser a vida, e lamenta ainda estar vivo:

Ah! Fortuna cruel! Ah! duros Fados!
Quão asinha em meu dano vos mudastes!
Passou o tempo que me descansastes,
Agora descansais com meus cuidados.

Deixastes-me sentir os bens passados,
Para mor dor da dor que me ordenastes;
Então numa hora juntos mos levastes,
Deixando em seu lugar males dobrados.

Ah! quanto melhor fora não vos ver,
Gostos, que assim passais tão de corrida,
Que fico duvidoso se vos vi:

Sem vós já me não fica que perder,
Se não se for esta cansada vida,
Que por mor perda minha não perdi.

No que se refere às características do classicismo, o poema possui a medida nova, isto é, versos decassílabos. Esse rigor formal produz uma estrutura harmônica, equilibrada. É possível apontar também influência greco-latina quando a voz poética faz referência à Fortuna e ao Fado como a divindades. Por fim, temos a temática da inconstância, recorrente na poesia camoniana.

 

Já no próximo soneto, a medida nova também é utilizada para falar do Amor. Assim, o eu lírico afirma que a Morte poderia acabar com o Amor por meio da Ausência e do Tempo. Além disso, a Morte uniria contra o Amor duas forças contrárias: a Razão e a Fortuna (destino).

 

Contudo, a voz poética diz que, se a Morte é capaz de separar o corpo da alma, o Amor pode juntar e unir duas almas em um mesmo corpo. Dessa forma, o Amor vence a Morte, apesar da Ausência, do Tempo, da Razão e da Fortuna:

A Morte, que da vida o nó desata,
Os nós, que dá o Amor, cortar quisera
Na Ausência, que é contr’ele espada fera,
E co Tempo, que tudo desbarata.

Duas contrárias, que uma a outra mata,
A Morte contra o Amor ajunta e altera:
Uma é Razão contra a Fortuna austera,
Outra, contra a Razão, Fortuna ingrata.

Mas mostre a sua imperial potência
A Morte em apartar dum corpo a alma,
Duas num corpo o Amor ajunte e una;

Porque assim leve triunfante a palma,
Amor da Morte, apesar da Ausência,
Do Tempo, da Razão e da Fortuna.

Veja também: Cinco poemas de amor de Fernando Pessoa

Escola literária de Luís Vaz de Camões

“Mona Lisa”, de Leonardo da Vinci (1452-1519), é a obra mais famosa do renascimento.
“Mona Lisa”, de Leonardo da Vinci (1452-1519), é a obra mais famosa do renascimento.

O classicismo é uma escola literária que teve seu auge, na Europa, no século XVI, como reflexo do renascimento. Portanto, as obras de Luís Vaz de Camões apresentam características dessa escola, tais como:

  • Racionalismo

  • Antropocentrismo

  • Neoplatonismo

  • Semipaganismo

  • Influência greco-latina

  • Simplicidade

  • Harmonia

  • Amor idealizado

  • Mulher idealizada

  • Rigor formal

  • Bucolismo

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Frases de Luís Vaz de Camões

A seguir, vamos ler algumas frases de Camões, retiradas de sonetos do poeta, cujos versos foram aqui convertidos em prosa:

  • “Que pena sentirei, que valha tanto, que inda tenho por pouco o viver triste?”

  • “Por sinal do naufrágio que passei, em lugar dos vestidos, pus a vida.”

  • “Jura Amor que brandura de vontade causa o primeiro efeito; o pensamento endoudece, se cuida que é verdade.”

  • “Converteu-se-me em noite o claro dia; e, se alguma esperança me ficou, será de maior mal, se for possível.”

  • “Amor um mal, que mata e não se vê.”

  • “Não sei para que é ter contentamento, se mais há de perder quem mais alcança.”

  • “Dobrada glória dá qualquer vingança, que o ofendido toma do culpado, quando se satisfaz com coisa justa.”

  • “Todo o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades.”

  • “O tempo cobre o chão de verde manto, que já coberto foi de neve fria, e, enfim, converte em choro o doce canto.”

  • “Louvado seja Amor em meu tormento, pois para passatempo seu tomou este meu tão cansado sofrimento!”

  • “Qualquer grande esperança é grande engano.”

Nota

|1| Segundo Vanda Anastácio, doutora em Estudos Portugueses, “esta peça permaneceu desconhecida até 1645, data em que surge publicada na primeira parte das Rimas dadas à estampa por Paulo Craesbeeck”.

Crédito da imagem

[1] Grupo Editorial Record (reprodução)

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