Quinhentismo é um período da literatura brasileira que vai de 1500 a 1601. Está, portanto, inserido no contexto das Grandes Navegações e da Contrarreforma Católica. Ele engloba a literatura de informação e a literatura de formação, que trazem os primeiros textos produzidos em território brasileiro ou sobre o Brasil, informativos ou de cunho catequizante.
Seus principais autores são Pero Vaz de Caminha, Hans Staden, Pe. Manuel da Nóbrega e Pe. José de Anchieta. A obra mais importante desse período é A carta de Pero Vaz de Caminha, considerada a Certidão de Nascimento do Brasil.
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O final da Idade Média (476-1453) foi marcado pelo aperfeiçoamento e uso da bússola, na navegação, e da pólvora, na fabricação de armas. Esses fatores deram ao ser humano uma sensação de independência em relação às forças divinas, pois, com tamanho poder, eles se viram capazes de vencer os obstáculos da natureza, atravessar o mar e conquistar novas terras. O uso bússola permitiu o surgimento das Grandes Navegações, já a pólvora fez os europeus invencíveis no domínio das novas terras.
Dessa forma, nos séculos XV e XVI, Portugal buscou expandir os seus domínios. Houve, então, expedições para a África, Ásia e América. Esta, oficialmente, descoberta por Cristóvão Colombo (1451-1506) em 12 de outubro de 1492. Tal descoberta levou espanhóis e portugueses a assinarem o Tratado de Tordesilhas (1494), que dividia o novo continente entre essas duas nações. Assim, em 22 de abril de 1500, a frota portuguesa chegou ao nosso país, data que ficou, oficialmente, registrada como da descoberta do Brasil.
Apesar do fim da Idade Média e do advento da Reforma Protestante, a Igreja católica ainda detinha grande poder político. A Coroa portuguesa, portanto, tinha o apoio da Igreja e vice-versa.
Com a Reforma Protestante, a Igreja católica empreendeu a chamada Contrarreforma Católica, e uma das medidas adotadas para combater a ameaça protestante foi a criação da Companhia de Jesus pelo padre Inácio de Loyola (1491-1556). Desse modo, os jesuítas foram enviados ao Brasil para catequizar os indígenas, ou seja, converter os nativos ao catolicismo.
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Fazem parte do quinhentismo (1500-1601) os primeiros textos, não necessariamente literários, escritos no Brasil ou sobre ele durante o primeiro século da invasão portuguesa. Desse modo, essas obras estão inseridas em uma destas categorias:
Estão inseridos nessa classificação os textos dos chamados cronistas, que relatavam sobre o que viam na nova terra. O público-alvo desses documentos eram os europeus, curiosos para saberem o que havia na terra descoberta. Por isso, essa literatura informativa é também chamada de literatura de viagem, já que é composta por relatos de viajantes europeus ao território brasileiro.
Assim, para portugueses, franceses e alemães que descreveram a nova terra, o Brasil era um paraíso tropical, pois o quinhentismo foi marcado por uma visão teocêntrica, religiosa, da realidade. Além disso, as crônicas dos viajantes europeus eram cheias de descrições e comparações, que buscavam, com base nos detalhes, mostrar aos leitores a beleza, as riquezas e as curiosidades da terra descoberta.
A literatura de formação ou literatura de catequese tinha o objetivo de converter os indígenas ao cristianismo. Portanto, os poemas e peças de teatro, de cunho catequético, eram direcionados a esse público.
Os principais autores do quinhentismo são:
Pero Vaz de Caminha (1450-1500): português e escrivão da frota de Pedro Álvares Cabral (1467-1520).
Hans Staden (1525-1579): alemão que passou nove meses prisioneiro dos índios tupinambás.
Pe. Manuel da Nóbrega (1517-1570): padre português, chefe da primeira missão jesuítica no Brasil.
Pe. José de Anchieta (1534-1597): jesuíta espanhol.
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As principais obras do quinhentismo são:
A carta de Pero Vaz de Caminha.
A carta de mestre João Faras.
Relação do piloto anônimo.
Cartas de Pe. Manuel da Nóbrega.
Arte de gramática da língua mais usada na costa do Brasil (1595), de Pe. José de Anchieta.
Duas viagens ao Brasil (1557), de Hans Staden.
Auto da festa de São Lourenço (1583), texto teatral de Pe. José de Anchieta.
Contudo, o texto mais importante desse período, devido ao seu valor histórico, é A carta de Pero Vaz de Caminha, assinada em 1º de maio de 1500, em que o autor descreve a nova terra e menciona suas primeiras impressões sobre ela ao rei de Portugal. Além disso, evidencia a intenção, da Coroa portuguesa, em explorar a terra descoberta, e da Igreja, em catequizar os indígenas, como se pode ver nos trechos a seguir:
“Parece-me gente de tal inocência que, se nós entendêssemos a sua fala e eles a nossa, seriam logo cristãos, visto que não têm nem entendem crença alguma, segundo as aparências. E portanto se os degredados que aqui hão de ficar aprenderem bem a sua fala e os entenderem, não duvido que eles, segundo a santa tenção de Vossa Alteza, se farão cristãos e hão de crer na nossa santa fé, à qual praza a Nosso Senhor que os traga, porque certamente esta gente é boa e de bela simplicidade. E imprimir-se-á facilmente neles qualquer cunho que lhe quiserem dar, uma vez que Nosso Senhor lhes deu bons corpos e bons rostos, como a homens bons. E o Ele nos para aqui trazer creio que não foi sem causa. E portanto Vossa Alteza, pois tanto deseja acrescentar a santa fé católica, deve cuidar da salvação deles. E prazerá a Deus que com pouco trabalho seja assim!
[...]
Esta terra, Senhor, parece-me que, da ponta que mais contra o sul vimos, até à outra ponta que contra o norte vem, de que nós deste porto houvemos vista, será tamanha que haverá nela bem vinte ou vinte e cinco léguas de costa. Traz ao longo do mar em algumas partes grandes barreiras, umas vermelhas, e outras brancas; e a terra de cima toda chã e muito cheia de grandes arvoredos. De ponta a ponta é toda praia... muito chã e muito formosa. Pelo sertão nos pareceu, vista do mar, muito grande; porque a estender olhos, não podíamos ver senão terra e arvoredos — terra que nos parecia muito extensa.
Até agora não pudemos saber se há ouro ou prata nela, ou outra coisa de metal, ou ferro; nem lha vimos. Contudo a terra em si é de muito bons ares frescos e temperados como os de Entre-Douro-e-Minho, porque neste tempo d’agora assim os achávamos como os de lá. Águas são muitas; infinitas. Em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo; por causa das águas que tem!
Contudo, o melhor fruto que dela se pode tirar parece-me que será salvar esta gente. E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar. E que não houvesse mais do que ter Vossa Alteza aqui esta pousada para essa navegação de Calicute bastava. Quanto mais, disposição para se nela cumprir e fazer o que Vossa Alteza tanto deseja, a saber, acrescentamento da nossa fé!”
Se Caminha é o principal representante da literatura de informação do quinhentismo, Pe. José de Anchieta tem essa mesma importância na literatura de formação, com suas peças de teatro e poemas de cunho catequizante, como se pode verificar neste trecho do Auto da festa de São Lourenço, referente à fala do personagem Aimbirê, um dos criados de Guaixará, o rei dos diabos:
AIMBIRÊ
Usarei de igual destreza
para arrastar outras presas
nesta guerra pouco santa.
O povo Tupinambá
que em Paraguaçu morava,
e que de Deus se afastava,
deles hoje um só não há,
todos a nós se entregaram.
Tomamos Moçupiroca,
Jequei, Gualapitiba,
Niterói e Paraíba,
Guajajó, Carijó-oca,
Pacucaia, Araçatiba
Todos os tamoios foram
Jazer queimando no inferno.
Mas há alguns que ao Padre Eterno
fiéis, nesta aldeia moram,
livres do nosso caderno.
Estes maus Temiminós
nosso trabalho destroem.
Contexto histórico das Grandes Navegações: séculos XV e XVI.
Literatura informação ou de viagem e literatura de formação ou de catequese.
Principais autores:
Pero Vaz de Caminha.
Hans Staden.
Pe. Manuel da Nóbrega.
Pe. José de Anchieta.
Principais obras:
A carta de Pero Vaz de Caminha.
A carta de mestre João Faras.
Relação do piloto anônimo.
Cartas de Pe. Manuel da Nóbrega.
Arte de gramática da língua mais usada na costa do Brasil, de Pe. José de Anchieta.
Duas viagens ao Brasil, de Hans Staden.
Auto da festa de São Lourenço, de Pe. José de Anchieta.
Questão 1 - (Enem)
Texto I
Andaram na praia, quando saímos, oito ou dez deles; e daí a pouco começaram a vir mais. E parece-me que viriam, este dia, à praia, quatrocentos ou quatrocentos e cinquenta. Alguns deles traziam arcos e flechas, que todos trocaram por carapuças ou por qualquer coisa que lhes davam. [...] Andavam todos tão bem-dispostos, tão bem feitos e galantes com suas tinturas que muito agradavam.
CASTRO, S. A carta de Pero Vaz de Caminha. Porto Alegre: L&PM, 1996 (fragmento).
Texto II
Pertencentes ao patrimônio cultural brasileiro, a carta de Pero Vaz de Caminha e a obra de Portinari retratam a chegada dos portugueses ao Brasil. Da leitura dos textos, constata-se que
a) a carta de Pero Vaz de Caminha representa uma das primeiras manifestações artísticas dos portugueses em terras brasileiras e preocupa-se apenas com a estética literária.
b) a tela de Portinari retrata indígenas nus com corpos pintados, cuja grande significação é a afirmação da arte acadêmica brasileira e a contestação de uma linguagem moderna.
c) a carta, como testemunho histórico político, mostra o olhar do colonizador sobre a gente da terra, e a pintura destaca, em primeiro plano, a inquietação dos nativos.
d) as duas produções, embora usem linguagens diferentes — verbal e não verbal —, cumprem a mesma função social e artística.
e) a pintura e a carta de Caminha são manifestações de grupos étnicos diferentes, produzidas em um mesmo momento histórico, retratando a colonização.
Resolução
Alternativa C.
A carta é um testemunho histórico político de Pero Vaz de Caminha, portanto, é escrita com base na perspectiva desse autor português. Já na pintura, é possível perceber a inquietação dos nativos diante da proximidade da frota de Cabral.
Questão 2 - (Enem)
A feição deles é serem pardos, maneira d’avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem-feitos. Andam nus, sem nenhuma cobertura, nem estimam nenhuma cousa cobrir, nem mostrar suas vergonhas. E estão acerca disso com tanta inocência como têm em mostrar o rosto.
CAMINHA, P. V. A carta. Disponível em: www.dominiopublico.gov.br. Acesso em: 12 ago. 2009.
Ao estabelecer-se uma relação entre a obra de Eckhout e o trecho do texto de Caminha, conclui-se que
a) ambos se identificam pelas características estéticas marcantes, como tristeza e melancolia, do movimento romântico das artes plásticas.
b) o artista, na pintura, foi fiel ao seu objeto, representando-o de maneira realista, ao passo que o texto é apenas fantasioso.
c) a pintura e o texto têm uma característica em comum, que é representar o habitante das terras que sofreriam processo colonizador.
d) o texto e a pintura são baseados no contraste entre a cultura europeia e a cultura indígena.
e) há forte direcionamento religioso no texto e na pintura, uma vez que o índio representado é objeto da catequização jesuítica.
Resolução
Alternativa C.
A pintura mostra o índio, enquanto o texto descreve-o. Portanto, ambos cumprem a função de representar o habitante das terras que sofreriam processo colonizador, ou seja, as terras brasileiras.
Questão 3 - (Unimontes)
Leia o trecho destacado do Auto de São Lourenço, de José de Anchieta.
GUAIXARÁ
Esta virtude estrangeira
Me irrita sobremaneira.
Quem a teria trazido,
com seus hábitos polidos
estragando a terra inteira?
Só eu permaneço nesta aldeia
como chefe guardião.
Minha lei é a inspiração
que lhe dou, daqui vou longe
visitar outro torrão.
Quem é forte como eu?
Como eu, conceituado?
Sou diabo bem assado.
A fama me precedeu;
Guaixará sou chamado.
Meu sistema é o bem viver.
Que não seja constrangido
o prazer, nem abolido.
Quero as tabas acender
com meu fogo preferido.
Boa medida é beber
cauim até vomitar.
Isto é jeito de gozar
a vida, e se recomenda
a quem queira aproveitar.
Partindo do trecho anterior e da leitura da obra, todas as alternativas estão corretas, EXCETO:
a) Sendo parte da produção jesuítica, o gênero auto adapta os temas à situação de comunicação e propósito da catequese.
b) O uso de nomes e referências indígenas no Auto de São Lourenço é uma estratégia a serviço do processo de aculturação.
c) O martírio de São Lourenço, dando nome à peça, representa o exemplo ou testemunho da salvação pela fé proposto ao indígena.
d) O Auto de São Lourenço assimila aspectos da mitologia indígena com a finalidade de promover a conciliação de valores religiosos contrários, propiciando a simpatia do indígena.
Resolução
Alternativa D.
O auto é um tipo de texto dramático de cunho religioso, portanto, é parte da produção jesuítica, com propósito de catequese, como afirma a alternativa A. Na peça de Anchieta, os nomes e referências indígenas têm o objetivo de aproximar o contexto cristão da realidade indígena; por isso, é correta a alternativa B. O objetivo de mostrar o martírio de São Lourenço é, com base nesse exemplo de fé, inspirar o indígena à conversão; assim, está correta a alternativa C. Desse modo, a única alternativa incorreta é a D, pois o auto não tem o objetivo de “promover a conciliação de valores religiosos contrários”, já que o objetivo de Anchieta era eliminar qualquer crença distinta da cristã.
Famoso poeta brasileiro, fez parte da segunda geração romântica.
O predicado é um termo essencial da oração que faz uma afirmação sobre o sujeito.
Indica uma condição em relação a um verbo, adjetivo ou outro advérbio.
Podem provocar efeitos indesejados na comunicação, entre eles a ambiguidade.
As palavras aportuguesadas são aquelas de origem estrangeira que foram adaptadas às normas ortográficas da língua portuguesa.